Exemplos Práticos de Paleografia

A Paleografia é a coluna vertebral de uma pesquisa profunda Histórica. Compreender a História do Reino implica aprofundar a análise documental das fontes primárias. Por isso, vou transcrever, com referências, este documento que encontrei para ajudar à prática da decifração.

[1ª linha]

“Dom Afom etc. Saude Sabede que G° Anes m°r em Gouvea de Riba Tamega Nos enviou dizer que a elle culparom na”.

O 1.° nome é frequentemente abreviado.

G° = Gonçalo

O nome costuma ser acompanhado do local onde reside, por isso, o m°r é abreviatura de morador.

[2ª linha]

“morte de huum G° Prz home de pee [pé] de Joham Rroiz Pª que fora morto em canavesses podera ora aver quatro anos”.

O traço acima da palavra pode substituir letras, como pode funcionar como ~ (caso de huum e homem). Rroiz é abr. de Rodrigues; Pª de Pereira.

[3ª linha]

“per rezom da quall morte se elle amorara [fugido] com temor das nossas Justiças E fora por ello presso em o dito”.

O “R” maiúsculo, usado também a meio das palavras como duplo r, pode escrever-se como V com um traço no meio. “P°” com traço sobreposto é “por”.

[4ª linha]

“logo de Gouvea E fogira da cadea [cadeia] sem fazer mall nem nojo a nenhūa pessoa E amdamdo asi amorado como”.

Logo é “terra”. Note-se que um q com traço isolado por cima, ou em arco desde o tronco, ou em arco somente acima, pode designar “qui”, “que” ou “qua”.

[5ª linha]

“dito he [é] as partes a que acussaçom da dicta morte pertençia [p com traço no tronco é “per” + tençia] lhe perdoarom [novamente, p com traço no tronco] segundo ver poderiamos per hum st°”.

St° = stromento, um documento notarial [estromento].

[6ª linha]

“Pco [abr. de Púbrico] de perdom que dello ouvera que per ante nos foy aprresentado que pareça ser [abr.] feyto E assynado per D° Soaz tam [abr. de Tabeliam] em o Julgado”.

A abreviatura de “Ser” assemelha-se ao “B” contemporâneo.

D° = Diogo

Soaz = Soares

[7ª linha]

“dAguiar de Soussa termo [“temo” com traço acima do “e”] da cidade do Porto [abr.] aos X do mes de Março deste prresente ano de IIIICXXVI per o quall se”.

O “Porto” está escrito “Pto”, com abreviatura de “or” acima do “P”.

O ano está sem o M. “Quatro centos – IIIIC”.

[8ª linha]

“mostrava que Mª Gllz fª do dito morto/ J°m da peneirada E Cª Ans parentes do dito morto aqua[n]do carto graao”.

Mª = Maria

Gllz = Gonçalves

fª = filha

J°m = outra abreviatura de Joham

Cª = Catarina

Ans [com traço sobreposto] = Anes

Carto = Quarto.

[11ª linha]

“conthudo // Pedianos por merçee o dcto sopcante que pois as as partes lhe perdoarom que em galardom do serviço [“ser” abr. + viço] que nos”.

O “as” repete-se, são normais enganos deste calibre. “conthudo” é “conteúdo”.

[12ª linha]

“elle fezera em nossos Reynos de Castella sem embargo do tpo de seis messes sam passados lhe perdoasemos”.

Percebe-se duas coisas: a) que o documento data da guerra contra os usurpadores de Castela; b) que este homem serviu o Rei na hoste. “Tpo” é abr. de “tempo”.

[13ª linha]

“a nossa Justiça a que nos elle per rrezom da dcta morte era thudo// E nos veendo o que noS elle asy dizer E pedir”.

“Thudo” é “teúdo”, diga-se, era concernente. “P” com abr. de “er”. “Q” com arco é “que” [e um “q” isolado não podia ser outra coisa].

[14ª linha]

“emviou E visto o perdom das partes se otªs hy non ha que requiridas [traço sobreposto de “ui” acima do q] devessem ser [abr.] E visto o perdom Jerall per nos outorgado”.

Jerall = Geral

Otªs = outras

[15ª linha]

“aos omiziado que nos aos dctos Reinos forom servir E querendo lhe fazer gça E merçee T/enho per [abr.] bem E per”.

“Omiziado” é mais um erro, deveria ser “omiziados”, diga-se, criminosos sob pena deliberada.

Gça = graça [abr. de “ra” acima do g].

[16ª linha]

“amoslhe a nossa Justiça a que nos elle per rrezom da dcta morte E fogida era thudo E obrigado E perdoamoslhe”.

Palavra dividida por duas linhas [per – doamoslhe].

[17ª linha]

“sem embargo do espaço de seis messes serem Ja passados E porem mandamos etc. [o rabisco]/ dada no Porto a XXX”.

Começa o protocolo diplomático final.

Porto = local onde o Rei mandou fazer e outorgar o documento.

XXX = o dia

[18ª linha]

“de Julho/ ElRey o mandou per o doutor Joham Teixª etc. Ferna Gonçalvez a fez ano de IIIILXXV [475 – 1475]”.

Teixª = Teixeira

Doutor João Teixeira é o nome do redator notarial.

Fernão [Ferna com traço sobreposto – ~] Gonçalves é o nome do escrivão que escreveu.