Roger Dubuis: A Ascensão de um Império Relojoeiro pela Visão de Carlos Dias

Carlos Dias

O Instituto Português de Relojoaria apresenta regularmente histórias relacionadas com os portugueses no mundo da relojoaria. Entre elas há uma que é impossível de contornar: a da Roger Dubuis, companhia que, sob a visão estética e empresarial de Carlos Dias, se expandiu de uma modesta equipa de três para uma empresa robusta de 350 colaboradores.

Há alguns anos atrás, a indústria relojoeira suíça acolheu um novo nome que rapidamente se tornou sinónimo de luxo e ousadia estética. Carlos Dias, um empreendedor nascido na pacata vila de Águeda, Portugal, fundou a Roger Dubuis, uma marca que hoje é um ícone global. O sucesso meteórico deste fabricante de relógios reflete não só o engenho técnico mas também uma compreensão perspicaz das tendências fashion.

Carlos Dias

Trajetória de Um Fundador

O percurso de Carlos Dias é tão fascinante quanto os relógios que a sua companhia criava. A paixão pela mecânica foi herdada do pai, uma influência que o acompanhou da infância até à fundação da sua própria marca. Dias, que inicialmente sonhou com o estudo das ciências económicas, escolheu o exílio em vez de uma vida sob a sombra da ditadura de Salazar. A Revolução dos Cravos encontrou-o em Paris, onde a sua jornada de autodescoberta e inovação realmente começou.

Roger Dubuis

A Ousadia de Roger Dubuis

Corria o ano de 1980 quando Roger Dubuis, um jovem artífice que havia aprimorado o seu ofício na Patek Philippe, decidiu trilhar o seu caminho em solo próprio. Já na casa dos quarenta, o seu atrevimento levou-o a desenhar complicações sob encomenda das marcas mais prestigiadas. Mas seria apenas em 1995, ao unir forças com Carlos Dias, ex-colaborador de Franck Muller, que fundaria a aclamada Roger Dubuis Horloger Genevois.

A Fuga e o Renascimento

O caminho de Dias foi pontuado por uma série de reviravoltas. Desde empregos modestos em França à gestão de uma cadeia de hotéis, onde se distinguiu pela excelência, até à aventura no design de mobiliário na Itália, que mais tarde o conduziu ao universo da moda. Cada uma destas etapas foi crucial para a formação do esteta e do empresário que viria a revolucionar a relojoaria suíça.

Genebra: O Berço de um Sonho

A paixão pela relojoaria foi um fio condutor na vida de Dias. Este fascínio desabrochou desde cedo com um simples relógio de bolso do avô e foi crescendo até se transformar num empreendimento que desafiaria as normas estabelecidas. Ao associar-se inicialmente com Franck Muller e depois ao lançar a sua própria marca, Dias trazia consigo uma visão que casava a excentricidade com a elegância. Lentamente, a marca construiu a sua reputação, concebendo obras-primas complexas que surpreendiam os mais exigentes conhecedores. Grandes complicações e inovações tecnológicas tornaram-se a assinatura da casa, produzidas em quantidades limitadíssimas, mas sempre celebradas pela sua beleza e engenho

Poinçon de Genève

O prazer que Roger Dubuis retirava de superar as adversidades levou-o a procurar o Poinçon de Genève não apenas para alguns, mas para todos os seus relógios. Uma garantia de que um relógio foi rigorosamente verificado quanto à durabilidade, qualidade de construção e consistência, e de que foi engendrado pela herança e tradição suíças inteiramente em Genebra.

Com o Selo como prova de sua mestria, a Roger Dubuis emergiu como uma figura de proa no mundo da relojoaria. Em cada feira de relógios, coleccionadores aguardam, com expectativa, pelo menos um novo calibre revolucionário. Em 2005, a marca celebrou o seu décimo aniversário com o Excalibur RD01, equipado com um duplo turbilhão e ponteiros retrógrados, precursor de outros modelos vanguardistas como o Velvet Secret Heart.

Roger Dubuis – Quatuor de 2013 – o relógio turbilhão sem turbilhão

Quem poderia esquecer do Excalibur Quatuor de 2013? Os seus quatro balanços interligados por cinco diferenciais distribuem o efeito da gravidade por quatro planos, valendo-lhe a alcunha de ‘o relógio turbilhão sem turbilhão’.

Roger Dubuis – Easy Diver

O Easy Diver da Roger Dubuis foi o primeiro relógio desportivo a incorporar um turbilhão e a cravar um diamante numa luneta de borracha. As incursões do atelier são destacadas por peças como o Velvet Amethysts And Spinels, mas também impressionam com proezas de engenharia como o Excalibur Perpetual Calendar Minute Repeater Tourbillon de 2007.

Da Expansão Acelerada à Aquisição pela Richemont

A empresa de Carlos Dias cresceu de forma rápida e imprudente, culminando na construção de uma enorme fábrica em Meyrin, nos arredores de Genebra, em 2001, que foi expandida em 2004 para mais de 13935 metros quadrados. Esta expansão foi impulsionada pela obsessão de Dias em fabricar relógios internamente, levando a empresa a adquirir os direitos de fabrico dos movimentos cronógrafos Lemania cal. 2310 e a estabelecer a sua própria oficina de esmalte, gerida por Dominique Baron (que mais tarde se tornou chefe de esmalte na Stern Creations mas faleceu em 2012).

Antes da recessão de 2008, a empresa, renomeada para Manufacture Roger Dubuis, orgulhava-se de quase trinta calibres próprios, incluíndo um exótico duplo turbilhão e um movimento cronógrafo de oito dias. Contudo, a maioria dos calibres tinha problemas funcionais devido à expansão acelerada. Após investimentos de cerca de 150 milhões de francos suíços e enfrentando uma procura decrescente devido à falta de fiabilidade dos seus relógios, a empresa endividou-se e começou a perder dinheiro, resultando na demissão de metade dos funcionários e na pressão do banco Credit Suisse para recuperar o seu investimento. Dias realizou uma saída apressada mas rentável em 2008, vendendo a sua participação de 60% na empresa para o grupo Richemont por um valor estimado em 150 milhões de francos suíços (os restantes 40% pertenciam a Akram Aljord, nascido na Síria e distribuidor da Cartier em Dubai, que vendeu a sua quota à Richemont em 2016).

Como retorno do seu investimento de nove dígitos, a Richemont adquiriu uma fábrica massiva com capacidade para produzir quase todos os componentes de um movimento de relógio, inclusive a espiral do balanço. Na época, muitos especialistas do setor especulavam que o conglomerado de luxo suíço tinha comprado a Roger Dubuis mais pela sua capacidade de produção do que pelo nome da marca. Uma boa parte dessa capacidade produtiva foi redirecionada para outras marcas da Richemont, incluíndo a Cartier, e a Roger Dubuis passou por uma reestruturação completa. Todos os movimentos produzidos internamente foram reengenheirados e a maioria descartada.

Roger Dubuis, contudo, mostrava-se satisfeito com a atenção e falava com entusiasmo da reviravolta que a Richemont promoveu na empresa. Hoje, a Roger Dubuis factura cerca de 50 milhões de francos suíços por ano, produzindo aproximadamente 5000 relógios, e tende a canalizar o espírito de Carlos Dias, em vez do do falecido Roger Dubuis, cuja visão efémera mas gloriosa da relojoaria de Genebra poderá, quem sabe, ser ressuscitada no futuro por outro empreendedor ambicioso.

O Futuro de Carlos Dias

Num movimento que espelha a sua visão empreendedora e o seu laço sentimental com a terra natal, Carlos Dias dedicou-se à vitivinicultura, ampliando assim o seu império através da aposta em produtos de alta qualidade que prometem levar o nome de Portugal mais além. Dias não esconde o seu amor pela Bairrada, a região que o viu nascer e que agora serve de palco para o seu mais recente investimento vitivinícola.

O Vinho e a Bairrada: Uma ligação Pessoal

Carlos Dias compara o terroir bairradino aos melhores solos de Bordeaux, região que o cativou há anos. A sua aspiração é elevada: alcançar o reconhecimento mundial dos vinhos da Bairrada, à semelhança do que fez com os relógios na Suíça.

Uma Diversidade de Produtos Premium

Não é só de vinho que se faz o portfólio actual de Dias. Em colaboração com Gianni Capovilla, uma destilaria especializada foi criada para o desenvolvimento de destilados de bagaço e frutas. Há também o presunto Pata Negra do Alentejo e queijos finos a caminho. Carlos Dias acredita que o vinho português sofre de falta de reconhecimento internacional. Para ele, o caminho para o sucesso global passa por Portugal afirmar a qualidade e unicidade dos seus vinhos e investir na promoção e visibilidade dos mesmos.

Dias é um exemplo de como a paixão pelas raízes e pela qualidade pode transpor fronteiras e criar uma marca de prestígio global. Seja no campo dos relógios de luxo ou nas vinhas da Bairrada, a sua filosofia de negócios mantém-se consistente: busca por excelência, desafio e inovação. Com uma visão que se estende para além dos vinhos – abrangendo destilados, presuntos e queijos de alta qualidade – Dias constrói um legado que promove não só o seu sucesso empresarial, mas também a riqueza e diversidade dos produtos portugueses. Enquanto se aventura por novos territórios e mercados, o empresário leva consigo um pedaço de Portugal, compartilhando com o mundo os sabores e a tradição da terra que o viu nascer.

A história de Carlos Dias e da Roger Dubuis é uma inspiração para todos nós. Mostra que, com talento, paixão e um pouco de coragem, é possível deixar uma marca indelével no mundo – uma marca que não é medida em horas, minutos e segundos, mas na alegria e admiração que cada criação única traz.